Nós últimos dias todos
recebemos consternados as notícias sobre o estado de saúde do líder
sul-africano e prêmio Nobel da Paz, Nelson Mandela, chamado carinhosamente por
seus conterrâneos de Madiba e por Barack Obama de “herói do mundo”, quando de
sua visita oficial ao Senegal. Sua atuação fundamental para o fim do apartheid, o então regime de segregação
racial na África do Sul, permanecerá como um legado de liberdade para todo o
mundo.
A Organização das Nações
Unidas (ONU) prepara ações para a Década Internacional dos Povos
Afrodescendentes (2013-2022). O decênio foi estabelecido pela própria
Organização por meio da Resolução A/66/460 após um ano de debates em torno do
racismo e das situações social, econômica e política da população negra mundial
na contemporaneidade.
Neste dia 20 de julho o
Estatuto da Igualdade Racial, aprovado pela Lei 12.288/10 completa três anos
desde sua publicação e é um marco legislativo na luta contra a discriminação
racial no Brasil. Ainda hoje muitos questionam sobre a necessidade de tal
Estatuto e esta é uma questão central no tema da interação racial e étnica em
nossa sociedade.
Para os que são favoráveis
à adoção de um instrumento jurídico como este, se colocam os que entendem caber
ao Estado papel decisivo para a correção de distorções históricas excludentes
da população negra.
Os
que se alinham em sentido contrário entendem desnecessária qualquer intervenção
promocional de igualdade racial por parte do Estado. Como escreveu em recente artigo
o Ministro Luis Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal, há três posições
básicas em relação à questão racial. A primeira é a do mais puro e assumido
racismo, baseado na crença de que alguns grupos de pessoas são superiores a
outros.
A
segunda sustenta que, no caso brasileiro, somos uma sociedade miscigenada, na
qual ninguém é diferenciado por ser, por exemplo, negro. Reconhecem
desequilíbrios no acesso à riqueza e às oportunidades, mas eles seriam de
natureza econômica, não racial. Por essa razão, os defensores desse segundo
ponto de vista opõem-se às políticas de ações afirmativas, que levariam à
“racialização” da sociedade brasileira, em canhestra imitação dos
norte-americanos.
A
terceira posição é a de que é fora de dúvida que negros e pessoas de pele
escura, em geral, enfrentam dificuldades e discriminações ao longo da vida,
claramente decorrente de aspectos ligados à aparência física. Uma posição
inferior, que vem desde a escravidão e que foi potencializada por uma exclusão
social renitente.
Não é mais possível negar a
discriminação ou considerá-la irrelevante na estrutura da desigualdade racial
brasileira, sob pena de ser indiferente aos dados apresentados por inúmeros
institutos de pesquisa, inclusive os oficiais, que demonstram, ano após ano, a
permanente discrepância dos indicadores sociais entre negros e brancos.
Depois da Nigéria, o Brasil
é o segundo maior país de população negra no mundo e o primeiro fora da África,
sendo ainda, historicamente, uma das economias mais excludentes. A população
negra é maioria entre os mais pobres e embora esta realidade seja amplamente
conhecida, não é comum ser reconhecida.
Daí a importância daqueles
que a reconhecem, que entendem que isso pode significar um avanço em direção à
superação, um passo adiante em relação à indiferença. Os que reconhecem a
existência da discriminação aceitam sua qualificação como questão social
pendente de solução.
* ADVOGADO E PRESIDENTE DA
COMISSÃO DE IGUALDADE RACIAL DA OAB/ES