sexta-feira, 29 de junho de 2012

Núcleo comum de direitos humanos

                 João Baptista Herkenhoff

Vitória vai sediar, na primeira quinzena de agosto, a Quinta Conferência Internacional de Direitos Humanos, sob o patrocínio da OAB. Haverá participantes de todo o Brasil e até mesmo de estrangeiros.

Um evento de tal magnitude exige que nos preparemos para dele participar, lendo, estudando, discutindo. Este texto pretende contribuir para a reflexão sobre o tema.

Com olhos de ver podemos constatar, no leque das culturas que se espalham pelo orbe terráqueo, um “núcleo comum universal” de Direitos Humanos. Este “núcleo comum”, no campo dos Direitos Humanos, corresponde aos “universais linguísticos” descobertos por Chomsky, na Linguística.

Sem prejuízo da existência desse “núcleo comum”, há uma “percepção diferenciada” dos Direitos Humanos nos vários quadrantes da Terra. São concebidos de uma forma peculiar pelos povos indígenas e pelos povos africanos, vítimas seculares da opressão.  Também é bem diversa a percepção dos Direitos Humanos no mundo islâmico, mundo belíssimo que é portador de uma cultura peculiar. Não há qualquer incompatibilidade entre Islamismo e Direitos Humanos, como uma visão imperialista de mundo pretende fazer crer.

A Poesia desvenda aquilo que não se vê à primeira vista. Daí que as vozes dos poetas ajudam na compreensão dos Direitos Humanos: A pena que com causa se padece, a causa tira o sentimento dela, mas muito dói a que se não merece. (Camões, num grito de revolta contra a pena injusta). Vossos filhos vivem convosco mas não vos pertencem. Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos. (Gibran Khalil Gibran, exaltando a grandeza da individualidade). Eu sou aquele que disse – os homens serão unidos se a terra deles nascida for pouso a qualquer cansaço. (Mário de Andrade, num hino à solidariedade). Auriverde pendão de minha terra, que a brisa do Brasil beija e balança, antes te houvessem roto na batalha, que servires a um povo de mortalha. (Castro Alves, indignado diante da bandeira brasileira hasteada num navio negreiro). Se discordas de mim, tu me enriqueces, se és sincero, e buscas a verdade, e tentas encontrá-la como podes. (Hélder Câmara, bispo, profeta, poeta, exaltando o direito à discordância). Seja a corte civil ou marcial, que mão lavra a sentença quando o juiz pressente sobre a toga forte espada suspensa? (Geir Campos, denunciando a falácia da Justiça quando submetida às baionetas). Esta sensibilidade, que é uma antena delicadíssima, captando todas as dores do mundo, e que me fará morrer de dores que não são minhas. (Newton Braga, celebrando a fraternidade).

Consolidar a ideia de Direitos Humanos é uma exigência para que a Humanidade possa sobreviver, sem se desnaturar.

João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, professor pesquisador da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo, autor de vários livros de Direitos Humanos, publicados pela Editora Santuário, de Aparecida, SP.

É livre a divulgação deste artigo, por qualquer meio ou veículo.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Repressão como ideologia

                João Baptista Herkenhoff
O país redemocratizou-se há mais de vinte anos, mas um substrato cultural autoritário teima em resistir ao processo democratizador.

Uma Constituição foi votada com intensa participação popular, como nunca havia acontecido no transcurso de nossa História. A Assembleia Constituinte, que votou a Constituição de 1988, abriu-se à escuta dos anseios da cidadania. Dessa escuta resultaram emendas populares assinadas por cerca de quinze milhões de eleitores, inclusive no Espírito Santo. As vozes da rua pleitearam Justiça Social, Educação, Democracia, Direitos Humanos. Não houve emendas populares pedindo o retrocesso institucional, o endurecimento da repressão, a supressão de garantias. Chegava-se ao fim do túnel e a comunidade nacional queria respirar Liberdade.

Entretanto, em contraste com a esperança de um novo ciclo histórico, bolsões de pensamento e comportamento ditatorial permaneceram em muitas instituições e espaços sociais, inclusive na Justiça, na Polícia, em órgãos de Governo, na Universidade, nos meios de comunicação.

É esse substrato cultural autoritário que está atrás de atos de violência praticados por autoridades públicas contra o cidadão. É esse substrato cultural que faz com que a Polícia e também a Justiça presumam a culpa e determinem que a inocência seja provada.  É esse substrato que admite que, na persecução do crime, vidas de inocentes possam ser sacrificadas. É esse substrato que não aceita a ação dos advogados, nos inquéritos policiais e nos processos judiciais. O advogado é visto como “inimigo público”. Não entra na cabeça dos ideólogos da repressão a ideia de que o advogado não defende o crime, mas sim o acusado de um crime ou até mesmo o culpado. Sem a presença altiva do advogado não se tem julgamento, mas farsa.

A violência urbana, que com razão amedronta o povo, encoraja a ideologia da repressão. Segundo essa ideologia, tropas especializadas, com atiradores de elite, estão autorizadas a matar, uma vez que se encontram no desempenho de papel estratégico para preservar a segurança pública. O resultado disso é uma ilusória segurança.

Faz-se indispensável uma discussão ampla sobre o papel da Polícia, discussão essa a ser travada dentro da corporação policial e também no seio da sociedade. Em muitas situações concretas, é a população que pede à Polícia “mão de ferro˜, deixando de lado os princípios constitucionais.

Dentro do organismo policial, milhares de vozes discordam de atitudes assumidas ao arrepio da lei e lutam bravamente para que tenhamos no país uma Polícia democrática.



João Baptista Herkenhoff é Supervisor da Coordenação Pedagógica da Faculdade Estácio de Sá de Vitória e escritor. Autor de: Curso de Direitos Humanos (Editora Santuário, Aparecida, SP).




segunda-feira, 11 de junho de 2012

Cavernas, mundo subterrâneos, escafandristas - onde a Terra Ronca/GO


                          Ana Claudia Farranha - Professora universitária - Brasilia/DF
Terra Ronca é uma região mais ao Norte de Goiás, onde o Cerrado é, de verdade, Cerrado ( não tem soja, como na Chapada dos Veadeiros/ Alto Paraíso/GO). Faz divisa com a Bahia e, é a terra das Cavernas. Mas, o que dizer de "alguéns" que saem de casa no feriado, com os filhos pequenos, enfrentam 07 horas de estrada... qual o sentido das cavernas??
A autora do texto, das fotos e da façanha - Ana Farranha...


Serra d(o)e Goiás - do outro lado é a Bahia



Para abrir os trabalhos ( Bar Esperança intinerante): pão e vinho - sempre bem-vindos
Subterrâneos sempre foram  meus mundos preferidos. Aquilo que não está na superfície. Que parte da entranhas....e forma, na mistura de água e calcário, desenhos que só a imaginação pode compreender. Essa é a sensação que a visita a uma caverna pode dar. Lá no fundo, escuro, há uma vida que apesar da falta de luz, se recria nas imagens que visitantes, curiosos e pesquisadores tem da ciência chamada espeleologia. Nesse embalo, Terra Ronca é uma divertida opção para feriados prolongados e férias.
Caminho e entrada da Caverna Angélica
 

O Rio Angélica - que corta a caverna e tem esse nome por causa dos frutos de uma planta


Tirando a estrada muito punk - tanto a BR 020 quanto a estrada de chão, o passeio vale a pena. A paisagem é linda.  Árida, seca, mas como típico do Cerrado, cheia de vida. Visitar as cavernas é uma excelente experiência, traz a possibilidade de conhecer o desconhecido e voltar para luz com outras imagens na retina.
Olha as formações (estalactites) e suas formas: um tigre

Peitinhos de Angélica ( a caverna - evidentemente!!)

E, por falar em caverna...um anjo..

Em Terra Ronca não muitas opções de hospedagem. A recomendação é a Pousada São Mateus -http://www.pousadasaomateus.tur.br/index.htm. Gente amiga, querida e hospitaleira. 
A boca da São Bernardo

Entrada da Caverna Terra Ronca - que tem esse nome por causa do barulho do Rio.

Ipês e Calcário: Terra Ronca vista de lado
Então, se a vontade de sumir bater, não hesite: junte a turma ( a molecada "guenta" o tranco dos sobe-e-desce) e rume para (o) Goiás.  Segue um pouquinho do que vimos e vivemos por lá. — Cavernas de Terra Ronca/GO

domingo, 10 de junho de 2012

Militante Pastoral Inocentada


João Baptista Herkenhoff



A Gazeta, em sua edição de vinte e sete de maio passado, abriu manchete: Inquéritos contra ex-líder da Pastoral Carcerária são arquivados.



No texto da notícia, lê-se:

“Foram seis anos em que não faltaram noites maldormidas, angústia, medo, lágrimas. Como Isabel Aparecida Borges, 67 anos, faz questão de dizer, um longo período em que viveu como se estivesse com uma faca no pescoço.””



Em outro trecho da matéria, o jornal esclarece:

“A pedido do Ministério Público Estadual, os inquéritos abertos contra Isabel, pela polícia, foram arquivados pela Justiça. A justificativa: ausência de materialidade e autoria de prática criminosa.”



É preciso explicar o que significa tudo isso para que todos sejam capazes de entender, mesmo os leigos em Direito.



O Ministério Público, na forma da Constituição Federal, é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.



O Ministério Público é o titular da ação penal. Quando o Ministério Público verifica a materialidade de um delito e indícios suficientes de autoria, seu dever é o de formular a denúncia, dando início à ação penal.



Quando o delito não se materializa e indícios de autoria não se fazem presentes, o Ministério Público opta pelo  arquivamento. Observe-se que para decidir pela denúncia o Ministério Público não tem necessidade de estar convencido da culpabilidade. Para este fim basta que se unam os dois elementos citados: materialidade do crime e indícios de autoria. Ou dizendo de outra forma: a) para que alguém seja condenado não bastam indícios de autoria; b) para que esse alguém seja denunciado os indícios são suficientes.



Nem indícios houve no caso de Isabel Aparecida. As acusações e suspeitas que pesaram sobre ela não tinham qualquer fundamento, motivo pelo qual o Ministério Público pediu o arquivamento, deixando assim de instaurar a ação penal.



Isabel Aparecida ingressou na Pastoral Carcerária convocada pela Fé Cristã. Frequentava em Vila Velha (ES) a Igreja do Perpétuo Socorro. Foi a partir da Paróquia que ouviu a voz do Espírito: Estive preso e me visitaste. (Evangelho segundo Mateus, Capítulo 25, versículo 36). Não obtante tenha sido educada no seio da Igreja Católica, também por outras portas poderia Isabel ter sido conduzida ao encontro com os presos. Católicos, protestantes, espíritas, seguidores de diferentes troncos religiosos compadecem-se dos encarcerados.



A Pastoral Carcerária está sempre a alertar sobre a dramática situação das prisões. Como a denúncia nunca pode ser abstrata e etéria, para exercer esse papel profético a Pastoral tem de colocar o dedo na ferida e apontar os erros. Pode então ocorrer o equívoco de ver a Pastoral Carcerária como opositora deste ou daquele Governo, o que não é verdadeiro. Aconteçam os abusos hoje, amanhã ou daqui a quarenta anos. Ocorram as afrontas aos direitos do preso no Acre, em Pernambuco, no Ceará, na Bahia, no Espírito Santo ou no Rio Grande do Sul, a Pastoral Carcerária denunciará e protestará dizendo: isto não é lícito, isto atenta contra a Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, preso é gente, preso não é bicho. Não foi à toa que o grande Sobral Pinto, católico de primeira linha, na defesa do líder comunista Luís Carlos Prestes, exigiu que em favor do grande Prestes fosse pelo menos respeitada a Lei de Proteção aos Animais, pois esta lei não admite que vivente algum seja maltratado.



João Baptista Herkenhoff é professor da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo, palestrante Brasil afora e escritor.