sexta-feira, 27 de maio de 2011

Soldados amados ou não

               Gilvan Vitorino C. S.
A agressão e morte do advogado Geraldo Gomes de Paula, 63 anos, em 2007, quando tentava cumprir sua “função essencial à justiça”, tal como prescrevem a CF/88 e o Estatuto da Advocacia, enseja uma reflexão acerca do papel exercido pela polícia e o direito à defesa.
            Os policiais acreditam serem treinados para cumprir a lei, em qualquer caso, qualquer que seja o suspeito de ato ilícito. Ledo engano. Um estudo da obra de Zaffaroni e Nilo Batista (Direito Penal Brasileiro – I), mostra que há uma criminalização primária, no processo legislativo, que seleciona condutas a serem criminalizadas, e uma criminalização secundária das agências criminalizadoras, que escolhem os atores a serem investigados e punidos, a depender, ainda, da vítima. Dentre estas agências está a polícia.      
Não é desconhecido o tratamento diferenciado que os policiais dão ao indivíduo, dependendo da raça, atividade profissional, nível de escolaridade, poder aquisitivo... Eles até pensam estar agindo corretamente, pois não percebem que todo o sistema conspira contra os miseráveis e eles são o braço armado do Estado para contenção das massas desfavorecidas. Não percebem que há um processo de doutrinação e pressão hierárquica tão bem feita que mesmo policiais negros preferem a abordagem de negros, policiais pobres preferem a abordagem de pobres. É flagrante a diferença de atuação que praticam num baile funk e numa boate da zona norte da cidade de Vitória.
            Quanto ao advogado vitimado, procurava cumprir sua missão de assistência jurídica, convicto de que sem a participação de um defensor habilitado não se pode fazer justiça. Ciente da lição de Rui Barbosa - “... perante a humanidade, perante o cristianismo, perante os direitos dos povos civilizados, perante as normas fundamentais do nosso regime, ninguém, por mais bárbaro que sejam os seus atos, decai do abrigo da legalidade” –, não podia negar defesa mesmo naquelas circunstâncias.
            Há um discurso criando pânico, levando a população e até os policiais a uma sensação de insegurança muito além da verdadeira realidade. Portanto, é preciso cautela maior dos policiais, os quais também são indivíduos do povo. Precisam lembrar que “somos todos iguais, braços dados ou não” e que essa doutrina que seguem, irrefletidamente, pode um dia ser-lhes desfavorável. Porque, num primeiro momento de suspeição deles mesmos, tornar-se-ão vítimas das arbitrariedades de um “estado policial” que atua em oposição ao “estado de direito”.           
Mesmo assim, se um dia o algoz virar vítima, haverá sempre um advogado para cumprir as palavras de Rui e pô-lo sob o abrigo da legalidade.

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