quarta-feira, 29 de junho de 2011

É assim, mas deveria ser?

Gilvan Vitorino C. S.
É muito comum que a crítica ao sistema prisional seja feita segundo uma opinião, seja individual ou mesmo construída coletivamente.
Mesmo o movimento em defesa dos Direitos Humanos, embora organizado, emite  juízos de valor acerca das condições de cumprimento de pena privativa de liberdade segundo critérios, não aleatórios, mas, que procedem de um arbítrio sem legitimidade.
Explico...
Fiz pesquisa para minha dissertação de mestrado em Ciências Sociais nos relatórios emitidos em inspeções feitas em presídios Brasil afora, buscando relatar a violência do cárcere. Verifiquei os relatórios do CNPCP – Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária -, os relatórios da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, os relatórios do CEDH – Conselho Estadual dos Direitos Humanos – os relatórios da Comissão de Direitos Humanos da OAB-ES e, ainda, os relatórios da Pastoral Carcerária feitos no Espírito Santo.
Causou-me boa impressão ver que, por exemplo, os deputados foram os que mais se interessaram pela violação de correspondências que sofrem os presos. Pois não se vê muita preocupação com esta violência, como se não fosse relevante.
O risco que se corre é entrar num presídio e julgar as condições de encarceramento segundo o que a direção das unidades prisionais dizem que é o correto ou segundo o que a mídia propala.
A superlotação dos presídios é emblemática quanto a isto. Afinal, quantos indivíduos podem ser encarcerados em determinado espaço? Seria uma informação que deveria ser buscada na direção da unidade? Adentrando os presídios e, como acontece frequentemente, reunindo-se com sua direção, dever-se-ia perguntar qual a capacidade da unidade?
Semana passada, estávamos em São Mateus acompanhando a primeira inspeção realizada pelo recentemente criado Conselho da Comunidade daquela Comarca. Foi uma inspeção com caráter pedagógico, para que os conselheiros pudessem trilhar o caminho deles.
Uma diretora nos acompanhou. Ao entrarmos numa cela, foi logo dizendo: “esta cela é para 06 presos”... “Possui 03 beliches”, etc.
Todavia, tentei refletir sobre aquele local com alguns conselheiros que se detiveram naquele espaço por algum instante: “cabem 06 presos aqui?”, indaguei.
Ora, só é possível responder à pergunta acima se for apresentada uma norma que prescreva o espaço mínimo para os presos.
A LEP – Lei de Execução Penal, 7210/84 – prescreve:
Art. 87. A penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado.
[...]
Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).
[...]

Ao disciplinar especificamente as condições da penitenciária, a Lei 7210/84 prescreve que a área mínima da cela (que deverá ser individual) deverá ser de 6,00m².
E qual deverá ser a área mínima em caso de celas coletivas?
Segundo a LEP,

Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.
Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.
[...]

De acordo com a Resolução n° 03, do CNPCP, de 23 de setembro de 2005, as celas deverão ter as seguintes dimensões:
a)   Cela Individual:
01 vaga à 6,00m²

b)   Cela coletiva:
02 vagas à 7,00m²
03 vagas à 7,50m²
04 vagas à 8,00m²
05 vagas à 9,00m²
06 vagas à 10,00m²
Assim, a título de exemplo, veja-se o caso do DPJ de Vila Velha – ES. Há relatório informando que em agosto de 2009 havia 300 presos na carceragem deste Departamento de Polícia Judiciária. E, noutro relatório, há a informação de que eram 06 celas de 9,00m² cada. Segundo informação do delegado, ainda no mesmo relatório, a capacidade era de 36 presos. Ora, pelo exposto na Resolução do CNPCP, observa-se o equívoco: se uma cela de 9,00m² comporta 05 presos, aquela carceragem comportava somente 30 presos.
Mesmo sendo uma diferença aparentemente pequena (35 – 30 = 05), vale o exemplo... Mais grave seria essa proporção numa unidade prisional muito grande.
Portanto, fica bastante claro que é preciso denunciar o sistema prisional referenciado no conjunto de regulamentos que há: Leis, CF, Tratados. E não podemos sucumbir à tentação de escolher o que pode ser aceito ou não. Devemos defender todos, absolutamente todos, os direitos dos presos, pois são pessoas com dignidade de sujeito de direitos.

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