Gilvan Vitorino C. S.
Quinta feira, dia 02 último, eu fui chamado para ir à delegacia onde se encontravam os jovens e adolescentes presos. Atendi ao telefonema de uma colega advogada por volta das 22:30h e logo fui ao encontro dos manifestantes e colegas defensores de Direitos Humanos.
Entrei logo para conversar com o delegado. Vi que se tratava não de criminalidade (como em regra acontece principalmente com os pobres) mas, na linha do que fala Vera Malaguti (veja no BLOG “Por um mundo sem prisões”), era mais um caso de criminalização. (Atente o leitor que, portanto, é um caso de manifestação de vontade: alguém que tem alguma autoridade para tanto decide que certa conduta é criminosa!)
Na delegacia, vi abuso flagrante de autoridade, pois conduziram meninos pra lá e pra cá constrangidos por algemas. Senão, veja o que prescreve a Lei 4898/65:
Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:
a) à liberdade de locomoção;
[...]
i) à incolumidade física do indivíduo;
[...]
Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:
[...]
b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei;
[...]
E o STF editou Súmula Vinculante que restringe bastante o uso de algemas. Eis o texto:
Súmula Vinculante 11
Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
O episódio daquele dia, somado à violência verificada em Barra do Riacho, mais o espetáculo grosseiro do BOPE do Rio de Janeiro, me faz pensar que há por aí uma nova valoração política (novos rumos, novos referenciais) que lembra o fascismo. Pois uma marca do fascismo é a forte presença dos militares no poder...
Por quê?
Ora, tanto aqui como no Rio de Janeiro, não se está diante de velhos gatunos da política. Pode-se discordar dos que governam estes dois estados, mas a história deles não é a mesma daqueles que estiveram ao lado da ditadura e se acostumaram a resolver as coisas com o uso da força policial.
Tanto aqui como lá, o expediente da força policial foi utilizado como primeiro artifício de resolução de conflitos. Então, na verdade, nem foi uma tentativa de resolver conflitos, mas de debelar o conflito. As autoridades foram muito apressadamente aos policiais buscar sua força. Não houve timidez...
O que se esperava de um governo com características populares (ainda guardo a esperança de que seja, ou volte a ser) era que seu governante fosse até as avenidas onde havia as manifestações, fosse ao quartel dos bombeiros (no caso do Rio) e olhasse no rosto daqueles que se manifestavam, enfrentasse o debate, andasse ao lado deles conversando, chamasse os manifestantes para dentro do Palácio, etc, etc.
Não sei se o modo como os jovens daqui se manifestaram nas avenidas foi o correto, não sei se foi uma manifestação sem organização... De qualquer forma, o que houve não me permite ter alguma dúvida de quem apoiar.
Sei que o que houve foi um enfrentamento entre a vassoura e a espingarda. Ora, sempre que eu estiver diante de um enfrentamento desse tipo tomarei as dores da vassoura.
Não posso chamar o atual governo de fascista. Seria exagerado e injusto de minha parte. Mas, é preciso que a força policial seja a última alternativa. E, quando não houver mais alternativas para a resolução de um conflito (falo de um conflito com amplitude política), mesmo assim, é preciso fazer como o rio no remanso: devagar, sem pressa.
Não se pode dar muito espaço para uma instituição militar: é preciso sempre lembrá-los de que acima do seu uniforme está o Estado de Direito. E há grupamentos militares que foram treinados para odiar: ao verem uma vassoura lembram logo do cano de uma espingarda.
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